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domingo, 23 de setembro de 2012

TERAPIA DO CARRINHO



Comida sempre foi uma das principais formas de socialização na maioria das culturas.
Internada várias vezes em hospitais públicos e conveniados percebi que, tanto em um, como em outro, não importa; a hora da comida também tem lá seu papel além de alimentar. Na hora em que o carrinho de refeição está chegando, algo acontece dentro da gente. Claro, que não para todos os pacientes, mas eu achava que isso só acontecia comigo; então descobri que não sou a única a esperar pela proximidade do som do carrinho de refeição pelos corredores do hospital.

Ao ouvir tal barulhinho, o paciente que está em melhores condições, já pula da cama para avistar o tal objeto. O outro que saiu do longo jejum não vê a hora de poder morder alguma coisa e, às vezes, até mesmo pra quem está fraco e sem apetite, o simples fato da chegada do carrinho, é sinal de que as horas estão passando.
E quando o carrinho pára bem em frente a porta do nosso quarto; huuumm, ficamos alvoroçados! 

Cada um apostando no seu próprio palpite: " Acho que hoje veio gelatina vermelha..." - "Que nada, aposto que hoje veio aquele “deliciooooso” insosso pudim de coco..." - "Eu tenho certeza que veio pudim de chocolate".
E aí, meu amigo, começam os risos delirantes. Saímos da realidade hospitalar e botamos a cachola pra funcionar, fazendo listas imaginárias de tudo o que existe de gostoso e que provavelmente não poderemos comer tão cedo e em alguns casos, nunca mais.
Este é um momento de grande socialização, confraternização, solidariedade. O que pode, ajuda o que não pode. O outro divide a fruta e, a euforia continua...
Aquele faminto que esteve de jejum por dias, mesmo reclamando do sabor, com um riso nervoso devora tudo como se fosse sua última refeição na vida.

Ainda que a comida não seja uma maravilha, esse é o momento da terapia, da compensação, da expectativa de conseguir tirar daquelas horas de sofrimento, um pequeno momento de distração e prazer.
Pouco a pouco vamos engolindo aquela gororoba, em meio a risos e trovas, tentando disfarçar o descontentamento com aquela comida sem graça e aquele cheiro enjoativo que insiste em fugir do marmitex e que em nada facilita a degustação.
No final, todos vamos nos aquietando; cada um vai tratar da sua higiene bucal, dos seus pensamentos, dos seus medos; até a hora do próximo carrinho de refeição.
By Edna Pereira

2 comentários:

  1. Adorei o texto Edna,é bem assim mesmo, um de nossos passatempos prediletos...rs. Lembro até quando estava internada eu e minha colega de quarto tínhamos um ritual nas refeições, cada dia "almoçavamos" na casa uma da outra, ou seja, na mesa que era cuidadosamente arrumada com direito a toalha, guardanapos, enfeites e... troca de sobremesas(qual sabor é a tua gelatina?),depois a caminhada para digestão... Ah,e o olhar de "gatinho do shrek" para pedir mais uma sobremesa para a copeira(o)...que não resistia e voltava com outra gelatina...nossa! acho que isso explica o pq enjoei de gelatina...kkkk mas fiz muitas amizades e guardo boas recordações!

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  2. Eda, Amiga Eda. Como a amiga Maria Rita, recordo-me, de dias de internações, depois dos procedimentos diários, dolorosos, o melhor era á hora da refeição. Infelizmente na maioria das vezes, alimentava-me, de lembranças de sabores. Dia feliz foi no meu aniversário que encontrava-me internada, e insistentemente fez um pedido. Comer uma macarronada. Choque!!! Assim foi a cara que toda a equipe médica. Venci pelo cansaço e passando a receita. Na hora da passagem do carrinho, eu estava na porta esperando, ansiosa. O mesmo sentimento de quando estamos esperando um amor, coração palpitando, mão e pés gelados, transpiração. Ele chega!! Meu macarrão!! Todas ás enfermeiras fizeram parte desse momento, aplaudiram!!! Minha felicidade.
    Agrupadas e apertadas na porta do quarto esperaram minha reação. Meu macarrão e eu.

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