SER OU NÃO SER DE NINGUÉM
Na hora de cantar, todo mundo
enche o peito nas boates e gandaias, levanta os braços, sorri e dispara:
"... eu sou de ninguém, eu
sou de todo mundo e todo mundo é meu também..."
No entanto, passado o efeito da
manguaça com energético, e dos beijos descompromissados, os adeptos da geração
tribalista se dirigem aos consultórios terapêuticos, ou alugam os ouvidos do
amigo mais próximo e reclamam de solidão, ausência de interesse das pessoas,
descaso e rejeição.
A maioria não quer ser de
ninguém, mas quer que alguém seja seu. Beijar na boca é bom? Claro que é! Se
manter sem compromisso, viver rodeado de amigos em baladas animadíssimas é
legal? Evidente que sim. Mas por que reclamam depois?
Será que os grupos tribalistas se
esqueceram da velha lição ensinada no colégio, de que toda ação tem uma reação?
Agir como tribalista tem conseqüências, boas e ruins, como tudo na vida. Não
dá, infelizmente, para ficar somente com a cereja do bolo - beijar de língua,namorar
e não ser de ninguém. Para comer a cereja, é preciso comer o bolo todo e, nele,
os ingredientes vão além do descompromisso, como: não receber o famoso
telefonema no dia seguinte, não saber se está namorando mesmo depois de sair um
mês com a mesma pessoa, não se importar se o outro estiver beijando outra, etc,
etc, etc.
Embora já saibam namorar, os
tribalistas não namoram.
"Ficar" também é coisa
do passado. A palavra de ordem hoje é "namorix". A pessoa pode ter
um, dois e até três namorix ao mesmo tempo. Dificilmente está apaixonada por
seus namorix, mas gosta da companhia do outro e de manter a ilusão de que não
está sozinho. Nessa nova modalidade de relacionamento, ninguém pode se queixar
de nada.
Caso uma das partes se ausente
durante uma semana, a outra deve fingir que nada aconteceu, afinal, não estão
namorando. Aliás, quando foi que se estabeleceu que namoro é sinônimo de
cobrança? A nova geração prega liberdade, mas acaba tendo visões unilaterais.
Assim, como só deseja a cereja do bolo tribal, enxerga somente o lado negativo
das relações mais sólidas. Desconhece a delícia de assistir a um filme debaixo
das cobertas num dia chuvoso comendo pipoca com chocolate quente, o prazer de
dormir junto abraçado, roçando os pés sob as cobertas, e a troca de
cumplicidade, carinho e amor.
Namorar é algo que vai muito além
das cobranças. É cuidar do outro e ser cuidado por ele, é telefonar só para
dizer boa noite, ter uma boa companhia para ir ao cinema de mãos dadas, transar
por amor, ter alguém para fazer e receber cafuné, um colo para chorar, uma mão
para enxugar lágrimas, enfim, é ter alguém para amar.
Já dizia o poeta que amar se aprende
amando. Assim, podemos aprender a amar nos relacionando. Trocando experiências,
afetos, conflitos e sensações. Não precisamos amar sob os conceitos que nos
foram passados. Somos livres para optarmos. E ser livre não é beijar na boca e
não ser de ninguém. É ter coragem, ser autêntico e se permitir viver um
sentimento... É arriscar, pagar para ver e correr atrás da tão sonhada
felicidade. É doar e receber, é estar disponível de alma, para que as surpresas
da vida possam aparecer. É compartilhar momentos de alegria e buscar tirar
proveito até mesmo das coisas ruins. Ser de todo mundo, não ser de ninguém, é o
mesmo que não ter ninguém também... É não ser livre para trocar e crescer... É
estar fadado ao fracasso emocional e à tão temida SOLIDÃO...
"Seres humanos são
anjos de uma asa só, para voar têm que se unir ao outro"
Arnaldo Jabor
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